A obrigação de prestar contas nos contratos com cláusula de alienação fiduciária em garantia

A alienação fiduciária é um tipo de garantia utilizada em operações de crédito e de financiamento na qual o devedor transfere para o credor a propriedade do bem, seja ele móvel (veículo, trator, colheitadeira etc) ou imóvel, até o pagamento da dívida, ficando, no entanto, com a sua posse direta. Quando a dívida é quitada, a propriedade é transferida definitivamente para o devedor/financiado, que passa a ter propriedade plena do bem.

A alienação fiduciária de bem imóvel é regida pela Lei nº 9.514/1997, enquanto a de bem móvel pelo Decreto-lei nº 911/1969. Em ambas as modalidades, após serem notificados a pagar as parcelas em atraso (constituídos em mora), caso o devedor não efetue o pagamento (purgação da mora) no prazo legal, a propriedade será consolidada no patrimônio do credor e o bem poderá ser vendido a terceiros ou levado a leilão (art. 26, §3º, da Lei nº 9.514/1997 e art. 2º do Decreto-lei 911/1969). A Lei nº 14.711/2023 prevê ainda a possibilidade de se realizar a retomada do bem mediante procedimento realizado em cartório, sem necessidade de ação judicial.

Nos dois casos (alienação fiduciária de bem móvel ou imóvel), o preço da venda do bem será utilizado para pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes, sendo que eventual saldo credor, se houver, deverá ser entregue ao devedor fiduciante.

A grande questão aí é que, na esmagadora maioria dos casos, as instituições de crédito (bancos, cooperativas etc), após procederem a venda do bem a terceiro – seja pela via direta ou por leilão (judicial ou extrajudicial) – não informam o devedor fiduciante sobre a existência de eventual saldo credor em seu favor, tampouco em relação ao montante do saldo devedor porventura existente, de modo a possibilitar que ele possa, por exemplo, liquidar esse saldo e restabelecer seu cadastro junto às entidades de restrição ao crédito (SCPC, SERASA e similares).

Nessas hipóteses, mostra-se perfeitamente cabível ao devedor fiduciante a propositura de uma ação de exigir contas para obrigar o credor fiduciário a “prestar contas” sobre o produto da venda e, caso comprovado a existência de saldo credor em favor do devedor fiduciante, a devolvê-lo (pagá-lo). Da mesma forma, caso demonstrada a quitação do saldo devedor após a venda do bem, caberá ao devedor fiduciante pedir a baixa de eventuais restrições cadastrais decorrentes do contrato de empréstimo com garantia de alienação fiduciária. Nas duas situações, cabível ainda uma indenização por danos morais decorrentes da manutenção indevida do nome do consumidor nos cadastros de restrição ao crédito.

Esteja atento a essas dicas e, caso tenha ficado com alguma dúvida sobre o assunto, entre em contato com um de nossos consultores especializados no assunto.

(*) Régis Santiago de Carvalho é Advogado há 25 anos, sócio da banca Régis Carvalho Advogados Associados (www.regiscarvalho.adv.br), Palestrante, Mestrando em Direito pela Universidade Autônoma de Lisboa (Portugal), pós-graduado em Direito Constitucional, Especialista em Direito Processual Civil, Tributário, Eleitoral e Bancário (com ênfase em crédito rural); Professor em Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito, Foi Conselheiro Estadual da OAB/MS por 4 mandatos, é Presidente e Fundador da Academia de Direito Processual de Mato Grosso do Sul – ADP/MS, é autor da obra “A Insujeição da Sentença Arbitral ao Precedente Judicial Previsto no Código de Processo Civil de 2015”, Editora Life e Coautor das obras “Práticas Contemporâneas Trabalhistas e Previdenciárias” – Tema: Os Provimentos Judiciais Legalmente Vinculantes e seus Reflexos nas Lides Previdenciárias – – Editora Quartier Latin – 2019, “O Procedimento de Cassação de Mandato de Prefeitos e Vereadores – Aspectos Atuais do Decreto-Lei nº 201/67 à luz da jurisprudência e do CPC/2015” – Life Editora – 2019 e “Os efeitos patrimoniais da união estável na terceira idade e a (in)constitucionalidade da imposição legal do regime de separação obrigatória de bens prevista no Código Civil Brasileiro” – Life Editora – 2022. Figurou por 2 vezes na lista tríplice para o cargo de Juiz Eleitoral do TRE/MS (2019 e 2023). Atualmente exerce o cargo de Diretor Tesoureiro da Escola Superior da Advocacia de Mato Grosso do Sul (ESA/MS), gestão 2025-2027.